"“Me pega desarmado – repetia Alonso, fixado na frase.Rosto tenso, trêmulo, punhal imóvel rebrilhando à luz do lampião, o barbeiro dominava o salão.– Agora vou te mostrar – insistiu, com um furor já repleto de cálculo e crueldade.Alonso, encurralado, olhava para o punhal. A mão que o esgrimia era grande, morena, de pele esticada, articulações nodosas, sem veias no dorso. Gelada, mas viva, inexorável, a curta folha de aço se aproximou pausadamente, com a ponta para baixo. Logo girou e ergueu-se, rapidíssima, relampejando em direção de seu peito. Alonso tornou a saltar, esquivando-se outra vez por muito pouco.”Trecho do conto “Diego Alonso”Em cerca de meia centena de contos, o uruguaio Mario Arregui (1917-1985) construiu um mundo narrativo no qual soube explorar a fundo e mostrar à flor da pele alguns conflitos e inquietudes tão enraizados quanto encobertos que, desde obscuras origens, moldam a natureza humana.Compelido a ter como subsistência terras rurais que herdou, tornou-se estancieiro, mas sobretudo um versado conhecedor da criação de gado num país que chegou a ter mais vacuns e ovinos do que homens e mulheres. Essa exigente ocupação, que contribuiu decisivamente na formação de sua personalidade, não o impediu de frequentar a vida social no departamento em que nasceu, Flores, tampouco de compartilhar de vez em quando, com suas amizades na capital, tanto a boemia intelectual como a rebeldia da luta política em Montevidéu, assumidas ambas com igual fervor.Com o perfil crítico da geração a que pertenceu, consequente leitor e viajante eventual além-fronteiras, apaixonado homem de esquerda que, durante a ditadura, pagou o preço de sua militância, foi mormente um escritor obstinado e rigoroso, articulador de uma linguagem austera, persuasivo e sedutor, adestrado na implacável e tensa estrutura do conto, na qual concebeu e produziu, desde a campanha uruguaia, algumas peças magistrais e antológicas.Desse labor exemplar, que indica o domínio do autor sobre personagens, situações e sequências, com a transparência e a naturalidade proporcionada apenas pelo íntimo conhecimento do vivido e do imaginado, numa escala que vai desde o drama profundo ao humor sagaz, este volume reúne, sob os sugestivos títulos de Cavalos do amanhecer e A cidade silenciosa, duas séries dos melhores e mais representativos contos de Arregui, na versão em língua portuguesa do experiente tradutor e narrador brasileiro Sergio Faraco, fiel amigo do autor e minucioso e lúcido intérprete de sua obra.Wilfredo Penco, presidente da Academia Nacional de Letras do Uruguai" 1. Mais extensa coletânea já publicada no Brasil de Mario Arregui, considerado um dos grandes artífices do conto latino-americano.2. Inclui vinte e um narrativas curtas, entre as quais “Noite de São João”, “O gato” e “Diego Alonso”, que costumam ser citados como exemplo de sua prosa austera e minimalista.3. Retrata sobretudo o mundo rural e a região dos pampas; uma de suas temáticas recorrentes é a solidão do homem do campo frente à natureza.4. A organização e a tradução são de Sérgio Faraco, que foi próximo do autor.5. Estancieiro uruguaio, Arregui (1917-1985) foi testemunha da violência da ditadura uruguaia, tendo sido preso e torturado durante oito meses.6. Sua obra demonstra a influência de alguns autores norte-americanos, como a de Ernest Hemingway.7. O escritor e crítico literário Ángel Rama, especialista em literatura latino-americana, caracterizou a obra de Arregui como “arte transparente, limpa e grave”.8. O conto “Lua de outubro” foi levado às telas do cinema pelo cineasta brasileiro Henrique de Freitas Lima.9. Agradará a leitores de Horacio Quiroga, Mario Levrero, Mempo Giardinelli e Mario Benedetti.
Sobre o autor(a)
Arregui, Mario
Mario Arregui nasceu em Trinidad (Uruguai), em 1917, descendente de imigrantes bascos e lombardos. Passou a infância no campo e em 1935 foi estudar em Montevidéu. Eram os anos da ditadura Gabriel Terra. Na Europa, estalava a Guerra Civil Espanhola. Em 1937-1938, engajado no movimento de ajuda à República Espanhola, começou a exercer mili¬tância política (que nos anos 70 o levaria à prisão, como a milhares de outros uruguaios) e a escrever. Nessa época, esteve no Paraguai e, mais tarde, no Brasil, Chile, Peru e também na Europa. Em Cuba, foi membro da comissão julgadora do concurso anual de literatura da Casa de las Américas. Seus contos já foram traduzidos para diversos idiomas, entre eles o russo, o tcheco, o italiano e o português. Faleceu em Montevidéu, em 1985. |
ISBN | 9786556662893 |
Autor(a) | Arregui, Mario (Autor) |
Editora | L&pm |
Idioma | Português |
Edição | 1 |
Ano de edição | 2022 |
Páginas | 184 |
Acabamento | Brochura |
Dimensões | 21,00 X 14,00 |