Uma aula de psicanáliseO relato freudiano do caso conhecido como o Homem dos Lobos está entre os mais célebres da história da psicanálise. É, de fato, o tratamento mais longo contado por Freud e, publicado originalmente em 1918 (tendo uma reedição aumentada em 1924), foi o último de seus grandes casos clínicos. Nele o autor relata os intrincados meandros da análise de um jovem adulto neurótico (Serguei Pankejeff era seu nome) cuja doença teria se originado numa psiconeurose infantil instalada aos três anos e meio, que por sua vez teria derivado de perturbações sexuais no segundo ano de vida. Na época da publicação deste texto, a importância (e até mesmo a existência) de uma sexualidade nas crianças era combatida inclusive internamente, por membros do movimento psicanalítico.Embora escrito após o término de mais de quatro anos de análise (em 1919, depois da publicação, analista e paciente retomariam o trabalho por mais quatro meses), o que vemos aqui é praticamente um work in progress psicanalítico. Como outros relatos de casos clínicos, serve como exemplo prático das teorias e das descobertas freudianas, conferindo-lhes corpo e robustez e estabelecendo conceitos como o de fantasia primitiva, recalque e construção em análise. O sonho é mais uma vez reafirmado como instrumento de pesquisa fundamental do inconsciente, e por meio de um árduo trabalho analítico chega-se a nexos causais entre a psiconeurose do paciente adulto e da criança que ele foi, inclusive remontando a uma cena primordial (outro conceito que se tornaria crucial na psicanálise) – ter testemunhado uma relação sexual dos pais – ocorrida quando o paciente tinha um ano e meio. Nas palavras do próprio Freud: “Sustento que a influência da infância já se torna perceptível na situação inicial da formação das neuroses, ao codeterminar de modo decisivo se e em que ponto o indivíduo falha em dar conta dos problemas reais da vida”.Tão ou mais importantes do que as conclusões, temos aqui os tortuosos e insuspeitos caminhos trilhados pela dupla paciente-analista. Eis o pensamento de Freud demonstrado em toda exuberância de suas possibilidades, exemplificando a nova compreensão por ele inaugurada sobre o ser humano, cujos sofrimentos psíquicos podem ser aliviados pelo processo de tornar conscientes, por meio da psicanálise, vivências inconscientes.O prefácio de Noemi Moritz Kon mostra como o Homem dos Lobos se tornou um caso único na história da psicanálise, tendo Pankejeff sido acompanhado, tal um arquivo vivo, por membros da Associação Psicanalítica Internacional até sua morte. 1) Um dos relatos de casos clínicos mais conhecidos de Freud, que foi objeto de inúmeros estudos e até mesmo adaptações artísticas. 2) Pela estrutura narrativa, como a de uma história, os relatos de casos clínicos (na comparação com os textos teóricos de Freud) se prestam maravilhosamente à leitura do público em geral, e não só de estudiosos e profissionais da área. 3) Tradução realizada diretamente do alemão por Renato Zwick, que já verteu do autor A interpretação dos sonhos, Totem e tabu, O homem Moisés e a religião monoteísta, A psicologia das massas e análise do eu, O mal-estar na cultura, O futuro de uma ilusão, Inibição, sintoma e medo e Compêndio da psicanálise, todos publicados pela L&PM Editores. 4) Além do ensaio biobibliográfico de autoria dos psicanalistas Paulo Endo e Edson Sousa (e que consta de todas as obras freudianas publicadas pela L&PM), o volume traz uma apresentação da psicanalista e escritora Noemi Moritz Kon, que assina também a revisão técnica. 5) Na interessantíssima apresentação, Noemi Moritz Kon reconta a história por trás do texto freudiano e a trajetória do próprio Homem dos Lobos (cujo nome real era Sergei Pankejeff), paciente de Freud que se tornou uma espécie de arquivo vivo da Associação Psicanalítica Internacional, tendo sido visitado por membros da associação e até recebido auxílio financeiro da mesma. 6) A única outra edição do texto traduzida diretamente do alemão (Cia. das Letras) não conta com qualquer aparato editorial além do texto freudiano. 7) Edição pensada para agradar ao leitor leigo, que possivelmente esteja lendo Freud pela primeira vez, além de psicanalistas e acadêmicos. 8) Este texto é um marco do desenvolvimento da psicanálise, sendo que aqui são reafirmados uma série de conceitos-chave, como recalque, cena primordial, fantasia primitiva e construção em análise. 9) Com este título a L&PM Editores dá prosseguimento à publicação avulsa das obras de Sigmund Freud com traduções feitas diretamente do alemão, em edições bem-cuidadas. O próximo título a ser publicado será Sobre a psicopatologia da vida cotidiana.
Sobre os autores(as)
Freud, Sigmund
SIGMUND FREUD (1856-1939), neurologista e criador da psicanálise, é autor de obra vasta e revolucionária, cujos títulos mais conhecidos incluem A interpretação dos sonhos e Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. |
Pinheiro Machado, Ivan
Capa: Ivan Pinheiro Machado sobre a pintura “Retrato de Dante” (1495), Sandro Boticelli 47 x 57 cm, têmpera sobre madeira. Coleção particular, Genebra, Suiça. |